terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

EXPLICANDO E DESMISITIFICANDO A – MINHA – QUIMIOTERAPIA.

O Centro médico não é grande, mais tem duas salas confortáveis, além de uma terceira, com um médico permanentemente de plantão. Na primeira, ficam os acompanhantes dos pacientes e, na outra, os próprios, confortavelmente instalados em poltronas reclináveis. Em geral, as seções ocorrem uma vez por semana, todas as semanas. Uma enfermeira, altamente especializada reina soberana, distribuindo, operando e controlando cada protocolo. (Protocolo é como se chama o conjunto de substâncias que serão administradas em cada um, conforme o tipo e as características específicas de cada câncer). Essas substâncias são administradas através de bolsas – como aquelas de soro nos hospitais – que pendem do teto e que ela vai aplicando, seja através da veia da mão, seja – como é o meu caso – através de um cateter cirurgicamente instalado do lado direito do peito. (Não me pergunte qual é a diferença entre um método e outro). Cada seção dura em média três horas e meia. Uma servente oferece cafezinhos, suquinhos, chazinhos e biscoitinhos (tudo no diminutivo, é claro). O “astral” é bom, o ambiente é descontraído e alegre, sobretudo quando a maioria é de mulheres, que, como se sabe, não param de falar (os homens, mais enrustidos e complexados, ficam lendo ou fingindo que dormem. Homem acha que se falar muito com outro homem, vão achar que ele é homosexual. Sobretudo, ele mesmo vai achar sobre ele mesmo...). Nesse ano e meio, apenas uma vez presenciei uma situação delicada, quando um paciente teve uma alergia súbita a uma das substâncias aplicadas. (o médico e a enfermeira rapidamente controlaram a situação, mas eu fiquei apavorado, pensei que o cara fosse morrer ali na nossa frente. Mas eles lidaram com a situação como se fosse a coisa mais normal do mundo... Profissional é isso).
A minha quimio tem uma especificidade: é que tenho dois protocolos: no primeiro, numa semana, faço, como todo mundo, as três horas e meia na clínica, e pronto. Na semana seguinte, após essas três horas regulamentares, a enfermeira me despluga dos saquinhos e me repluga com uma garrafinha que fica dentro de uma pochete que eu, então, carrego na cintura por dois dias, ao fim dos quais a garrafinha se esvazia. A coisa é discreta, parece mesmo uma pochete e, com uma camisa pra fora da calça, posso fazer tudo normalmente, sem que ninguém note nada de diferente. (O difícil é dormir; são duas noites mal dormidas).
Bem, em suma, a quimio é isso e assim. Não dói, incomoda um pouco, é meio chato, mas da pra levar.

PERRENGUES DA QUIMIO.
- Toda quimio depende do estado de saúde do paciente. Isso significa que, na véspera de cada uma, temos que tirar sangue. Aí, o médico verifica as plaquetas, a anemia etc e libera ou não o tratamento para aquela semana. Eu já fiquei anêmico algumas vêzes, mas o médico, sadicamente, optou por me receitar umas injeções na barriga. Já tomei dez (calma, gente, dói só um pouquinho...).

- Enjôos, aftas, queda de cabelo. Não tive nenhuma dessas ocorrências. Perguntei ao médico porque só as mulheres sofriam com a queda dos cabelos; ele me respondeu que era porque a quimio tinha sido inventada pelos homens...

- Diarréia. Essa, quando bate, é braba. No meu caso, a coisa se complica porque sou um glutão nato. Não faço nenhum tipo de dieta, continuo comendo muito, e de tudo. Por exemplo, outro dia estava andando pela São Clemente quando vi num boteco chechelento a seguinte promoção do dia: "Rabada com agrião e polenta". Encarei, e passei a tarde estacionado no troninho. Mas não me arrependo, valeu cada mordida. (Agora, já estou anunciando - para o horror de toda a família - que estou pensando em revisitar uns acarajés apimentados que uma baiana fake faz todos os sábados num quiosque da Cobal).

- Neuropatia Medicamentosa Periférica. Trata-se de um leve comichão permanente nas pontas dos dedos da mão e dos pés, devido a uma substância - platina - da quimio. Os médicos dizem que passa com o tempo. Bem, já estou com isso há uns cinco meses e até agora nada. Mas, você acaba se acostumando, e tudo bem.

- Estafa, exaustão. As vezes, a quimio te deixa literalmente prostrado. Nessas ocasiões, gosto de ficar esparramado no sofá com toda a família me paparicando. Cafezinhos, suquinhos, chazinhos e biscoitinhos (tudo no diminutivo, é claro).

- Estou tomando agora uma substância nova no meu protocolo. O médico já tinha me avisado que ela era mais pesada e que uma das conseqüências era a erupção de pequenas bolinhas vermelhas por todo o corpo. Ele me disse também que, quanto mais embolotado eu ficasse, mais isso indicava que o tratamento estava dando resultado. Caraca! Estou todo embolotado.

No mais, após cada seção, eu e a Glaucia sempre tomamos um chocolate ou cafezinho na Kopenhagem da esquina. Faz parte.

A PROPÓSITO: LIÇÕES DE VIDA.

- Tenho um amigo de infância que teve há uns seis anos atrás um AVC severíssimo. Bem, ele hoje é um cara de bem com a vida e com a própria sorte, apesar das limitações e da dor permanente que sente do lado “morto” do corpo (!). Quando vou visitá-lo, nas poucas palavras que consegue pronunciar - e por iniciativa dele -, sempre cantamos juntos aquela música do Waldik Soriano: “Sorrrria meu bem, sorrrria....”

- Segundo o dr. Carlos Alberto Plastino, analista da minha irmã, “viver é como andar de bicicleta: se parar, cai”.

EM TEMPO: o bode começou em 2009 quando notei que havia sangue nas minhas fezes. Vacilei, porque demorei a tomar providências; de qualquer modo, em novembro fiz uma colunoscopia que detectou um tumor maligno no intestino. Fui operado (não, não fui colostomizado) e logo em seguida comecei uma série de 12 seções de quimioterapia. O resultado foi ótimo, pois os exames mostraram não haver mais nenhum sinal maligno no corpo. Teoricamente, estava curado. Bem, três ou quatro meses depois, num exame de rotina (quem teve câncer tem que fazer esses exames para sempre) foi detectado uma metástase atingindo o fígado e o pulmão. Recomecei então a quimio, e é nesse ponto que estou atualmente.
Na verdade, o câncer não mudou quase nada no meu cotidiano. Trabalho um pouco menos, é verdade, e me canço com mais facilidade do que antes. Mas tenho uma vida absolutamente normal, continuo fazendo tudo que gosto e que sempre fiz. Em suma, vou levando “como Deus é servido”, se é que vocês me entendem...

Nenhum comentário:

Postar um comentário