quinta-feira, 24 de junho de 2010

O ócio santo e eficaz I

Ouvir música, ver tv, ler livros:
Abrir portas dentro de si.
Para quem é indiferente, abre pra fora.
Para quem não é, abre pra dentro.

Nos mosteiros medievais, chamava-se a contemplação de octium sanctum.
O ócio santo e eficaz,
Primeiro estágio da contemplação.
Ante-sala da sabedoria.

“Ócio criativo”: nunca entendi bem esse conceito. Pra mim, “ócio criativo” não passa de ócio culpado. A criatividade, de fato, não pertence ao universo de possibilidades inerentes ao ócio, mas às do trabalho. Criatividade é fazer; ócio é não-fazer.
“Ócio criativo” é como o hobby, essa invenção americana que convence você a trabalhar enquanto... descansa do trabalho.



Ócio santo e eficaz II



Perambular por janelas também faz parte do ócio santo e eficaz. Quando se tem uma janela como essa - é claro!

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quinta-feira, 17 de junho de 2010

Rock Revival by you tube.

Bandas de rock e cantores/as que povoaram meus sonhos e minhas revoltas durante os anos '6o/70 - como não entendia muito bem as letras acho que me identificava por puro instinto - e agora, facilmente acessados pelo You Tube:
- Debie Jordan - Hey you.
- Quiksilver Messenger Service - Mona/Who do you love.
- Incredible String Band - This moment. Woodstock '69/October song/Maya.
- Joan Baez- Forever young.
- Boris Vian - Le déserteur.
- Georges Moustaki - Ma solitude.
- Barbara - La solitude/Ma plus belle historie d'amour/Dis, quand reviendras tu?
- Fairport Convention - Fortheringay.
- Country Joe - Rock and roll music. Woodstock 1969.
- Van Morrison - Madame George.
- John Cale - Hallelujah
- Joy of Cooking - Brownsville Mokingbird. Joy of Cooking live 1974. People's Park. footage.
- Leonard Choen&Web Sisters. If it will be you will.
- Martha Waingrigth - The Traitor.
- Hippies, cops and the 1960's. Protest response.

Versos, frases, pensamentos que gostaria de ter tido/dito/escrito

- A procura sempre devolve quem procura à si mesmo. Gustavo Bernardo.
- Fazer experiências com o pensamento não é para indivíduos de alma vazia. Mauro A. de Souza.
- Não digo que encontei o paraíso, mas sei o que é uma mente quieta. Cássia Kiss.
- Por prazer da tristeza, eu vivo alegre. Adélia Prado (Essa é hors-concurs!).

Paradoxos do dia-a-dia

O telefone - quando está desligado, está ligado.
O goleiro - depende que seu time jogue mal, para que possa jogar bem.

A grande sacada de Deus

Dou um crédito à existência de Deus só por ter criado as mulheres,
esses seres singulares, tão profundamente outro.
As vezes lagartas, às vezes borboletas.
Já das cabeças, por pudor, não falo.
E os atributos, então?
(Pentrei algumas, amei todas as feias)

Sinto falta de uma certa costela mas,
- por Deus, não reclamo -
Pago o preço com prazer
... e alguma resignação.

A filosofia

Tal como o sal de dona Canô,
A filosofia também é um dom de Deus.

A Descoberta do Buda.

Saber de si,
salva!
Ver-se como se é,
liberta!

A Natureza

Fogo, queima.
Ar, sopra.
Água, mole.
Terra, dura.
Rios, rios.
Montanhas, montanhas.
Plantas, plantas (altas ou baixas, verdes ou não).
Bichos, bichos (pena, pelo, ou plumas).
Peixes, peixes: nadam
Pássaros, pássaros: voam.
Árvores, arvores: no verão, verdade.
no outono, amarelas.
Na primavera, florescem.
No inverno, não.

É simples.
Nenhum mistério, nenhum valor, nenhuma qualidade.
A natureza é o que é.
Soé.

Continuando a série do zen

ZEN I3
O zen afirma:
A razão não é via exclusiva de desvendamento do real.
A linguagem usual não é o veículo único para desvendá-lo.
As religiões formais não esgotam a questão da espiritualidade.

(Como questão e busca
- como verdade interior que emana do ser -
a espiritualidade independe dos caminhos propostos por elas).
Zen I4
A mão na porta.
A mente na mão.
A porta não leva a parte alguma.
Abre só pra dentro.

Zen I5

Pra dentro,
o prazer da sabedoria.
Pra fora,
a autoridade da fé.
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terça-feira, 8 de junho de 2010

O Zen

Venho estudando o zen já há alguns anos. Minha proposta é abordá-lo de um ponto de visa leigo - isto é, de alguém que não é necessariamente um adepto - mas, sobetudo, de um ponto de vista laico -isto é, de alguém que não é necessariamente um religioso. Esses poemas - adaptados e ligeiramente modificados - foram extraídos de um livro que venho escrevendo sobre ele.
(Pobre do autor que não plagia a si mesmo).

Zen 1

O zen é uma linguagem.
E o silêncio?
Bem, o silêncio
é a linguagem muda do zen.

Zen 2

O zen mergulha atrás de um silêncio
que nunca o esgota.
Que parte, a cada vêz,
em direção a seu avesso.
Irredutível e maleável,
o zen envolve e transforma.
Quebra a razão.
Silencia a linguagem.
Ilumina a consciência.

Zen 3

Através do verbo,
você se apropria de você mesmo.
Mas é imerso no silêncio
que você se transforma.

Zen 4

A religião formal tem certezas.
Já o zen, bem, o zen não tem nenhuma.
Logo,
o zen não é religião formal.

Zen 5

Não-saber como premissa.
Não-agir como condição.
E o silêncio como deciframento.

Zen 6

Onde não há dogma,
não há culpa.
Onde não há mestre,
o saber viceja.
Floresce o ser.

Zen 7

Mergulhado na condição humana,
o zen é menos religão pra fora
que intuição pra dentro.
Mais psicanálise, que religião.
Mais consciência, que fé.
Mais aprendizado, que dogma.
Mais sabedoria, que devoção.
Sim, o zen envolve uma terapia.
nos cura de nós mesmos:
Cura da vida,
disso,
que somos.

Zen 8

Não, o zen não é religião.
Não abriga visões teocêntricas da criação.
Não conta histórias enigmáticas sobre origens e destinos.
Não foi "dado" aos homens como graça para redimí-los.
Não, o zen não é religião.
Não tem "causa primeira", nem povo eleito.
Não incorpora missão alguma.
- nenhum enviado cuja missão é resgatar o pecador do pecado -
Nenhuma contemplação, recompensa alguma como prêmio.
Não, o zen não é religião.
Não anuncia o final dos tempos,
nem a redenção no Reino dos Céus.

Zen 9

Dizer o que o zen é,
é reduzí-lo à razão,
subordiná-lo à linguagem.
É empobrecê-lo, empobrecendo-se.
Dizer o que o zen é,
é trair o zen.

Zen 10

Não faz caridade,
não tem compaixão.
Não se apieda e não se debruça.
Não manipula.
Não acumula méritos.
Não envaidece e não credita.
Não se regozija.
Sem pecado ou culpa,
não se dirige a ninguém.
"Os monges piedosos", diz a doutrina,
"não entram no nirvana".

Zen 11

Mais - doutrina para ser pensada.
Menos - religião para ser rezada.
Linguagem espiritual, discursos,
onde escolas diversas encontram abrigo,
suporte e sabedoria.

Zen 12

Zen é a consciência dos limites do verbo.
Outra linguagem,
por outros meios,
para outros fins.

Zen 13

Filosofia da quietude.
Prática de mansidão.
Metafísica do silêncio.
Há mais significações no silêncio do zen
do que palavras são capazes de expressar.
O silêncio do zen mora no vazio.
(Transborda, portanto, de conteúdo).
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quinta-feira, 3 de junho de 2010

Poesia

A poesia aflora
e deflora o poeta.

UTI

Entubado
numaUTI soturna.
"Mais você", "Xuxa", "TV Globinho".
Sobrevivi!
Indamais,
virei poeta.

Todos e nenhum*

Sou hoje a soma de todos
e de ninguém em particular.
Amanhã já não serei ninguém
e serei, então, todos.

Entre todos e ninguém
já não sei quem sou.
Se sou todos, em cada um,
ou se, em todos, nenhum.

* Poema inspirado no conto "O Imortal" de Jorge Luis Borges: "Eu fui Homero; em breve serei ninguém, como Ulisses; em breve serei todos: estarei morto". In: Borges, Nova Antologia Pessoal. Ed. Sabiá, RJ, 1979.

A doutrina do Buda

É preciso, antes, ser alguém,
para depois, ser ninguém.
Ser inteiro, antes,
para não ser, depois.
E, permeando tudo,
o vazio,
que tudo contém.

(E o Buda - antes e depois -
na palma da minha mão).

Ateísmo IV

Sou ateu.
Definitivamente, não me conformo do jeito que Deus é.

Livros

Uma biblioteca é sempre imaginária e infinita.
Desejo bruto que não se esgota.
Centro do (meu) universo.
Labirinto borgeano onde me perco e me acho.

Livros são só um: justa medida do que se é.
Abertos: dizem quem somos.
Fechados: referência material e conforto espiritual.

Relação delicada de mútua dependência.
Mesma identidade numa mesma unidade de sentido.
Afetuosa e recíproca semelhança cotidiana.
Extensão e prolongmento

Celebração

Mil sonhos de consumo
Mil gatas por aí
Mil vidas para curtir.

Mil livros a minha espera
Mil discos do barulho.
Charutos, wiskies, viagens.
Mil vinhos servidos,
e a boa mesa.

E Pete Townshend surdo.
Só faltava essa...
(Long live rock'n roll!)

Relatividade

O cristianismo nasceu das palavras de Jesus.
Imerso no silêncio, Buda teceu a doutrina do budismo.
Com a espada de Maomé, o Islã quer cortar a cabeça dos infiéis.
No hinduísmo, Shiva - o de muitas faces - constrói e destrói mundos.

E eu
- pobre de mim! -
empestiando a casa
com um charuto na mão.

Filosofia III

Performance da mente.
Meandros de si.
Tramas.
É escuta e é escrita
internas e externas.
Não tem porto, nem âncora.
Escorre.
Matéria bruta que a mente poli.

Às vezes doma,
Às vezes não.

A flexa do tempo

Infância,
sopa no jantar.

O círculo se fecha.
O tempo não existe, disse
o Buda e disse o Borges.
(E a flexa sempre atinge o arqueiro)

Velhice,
sopa no jantar.

Silêncio II

O blá-blá-blá-blá do mundo
em troca do silêncio.
O ocidental fala
para tentar entendê-lo.
O oriental o escuta
para saber o que ele é.

ATEISMO III

O ateísmo é um negativo positivo
porque afirma o que nega:
Deus não existe!