segunda-feira, 30 de maio de 2011

SABEDORIAS PROFANAS.

- Beatle bom é beatle morto. Pedro Teixeira.

- Tive que encontrar em mim o meu remédio.
Marcelo Yuka.

SOBRE BUKOWSKI

Quando a editora Caresse Crosby da revista Portfolio, an International Review pediu numa correspondência que o escritor descrevesse brevemente “quem ele era”, Bukowski respondeu; “Estimada senhorita Crosby, não sei quem sou”. Bingo!

- Se queres saber onde está Deus, pergunte a um bêbado.

- A diferença entre a arte e a vida, é que a arte é mais suportável.

- Me interessam mais os pervertidos que os santos.
(Acho que Nietzsche assinaria embaixo).

- O amor é ridículo porque não dura. Mas o sexo é ridículo também, porque não dura o suficiente.

- Não escreva para salvar o mundo. Escreva para salvar-se.

SOBRE HERÁCLITO

- Prefiro tudo aquilo que se pode ver, ouvir e entender.

- A harmonia invisível é superior à visível.

- Procurei-me a mim próprio.

- Mesmo percorrendo todos os caminhos, jamais encontraremos limites da alma, tão profundo é o seu Logos.

- O caminho para baixo e o caminho para cima é um e o mesmo.

- O nome do arco é vida, sua obra, a morte.
Quem se esquivará do fogo que não se apaga?

POEMAS QUE GOSTARIA DE TER ESCRITO

E pensar que depois que eu me for,
haverá mais dias para os outro, outros dias,
outras noites.
Cães andando, árvores balançando ao
vento.

Não deixarei tanto
algo por ler, talvez.

Um reblde na estrada
devastada.

Paris às escuras.
Charles Bukowski


O QUE NÃO EXISTE
Ele
Que não existe

Mas que existe
pela sua não-existência.

Eu sou o verbo
(dizem que Ele disse)

E o verbo é dito por todos,
Plantado no pensamento,
Criando a sua existência.
Glaucia de Aguiar.
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quinta-feira, 26 de maio de 2011

APOSENTADORIA.

Estou aposentado!
Já comprei um pijama de listras azuis e um par de confortáveis pantuflas. Agora, estou pesquisando em qual bucólica pracinha passarei minhas tardes jogando damas.

O TAOÍSTA.

Sendo,
sabe de si.
Sendo,
é um com a natureza.

(Indiferente,
o Tao está presente)

O Tao mantém o taoísta com os pés no chão. Por isso, é claro!, o mestre taoísta não chega a lugar nenhum!

SABEDORIA CHINESA.

Para contrair,é necessário primeiro expandir.
Para enfraquecer, é necessário primeiro fortalecer.
Para destruir, é necessário primeiro promover.
Para agarrar, é necessário primeiro dar.

Isso é chamado de luz sutil.
O fraco e o terno sobrepujam o duro e o forte.
Lao-Tzé. Tao-te-King.

(E para ser ninguém - o sábio - é preciso primeiro ser alguém - o homem comum).

REFLEXÕES SEM DOR.

(Sobre a solidão).
- A solidão voluntária é premissa, síntese: só ser com ser só. “Em outras palavras, na medida em que somos os amigos inatos, jurados e ciosos da solidão, da nossa própria solidão mais profunda de meia-noite e de meio-dia, essa é a espécie de homens que somos nós, os espíritos livres!”. Nietzsche. In: Friedrich Nietzsche, Para além do bem e do mal.

- Todo escritor abriga um estranho dentro de si. Todo escritor escreve para defender sua solidão. É natural, pois o que ele vê, depende de como ele é: cada um é do tamanho daquilo que vê. “Vemos aquilo que melhor podemos ver a partir de nós mesmos”. In: Carl Gustav Jung, Tipos psicológicos.

- “Vive na solidão”, “vive ignorado.” Epicuro. In: J. Mewaldt, Pensamentos. Epicuro. Diversos e férteis, os mesmos caminhos da filosofia apontam para um horizonte comum: a sabedoria. A sabedoria, por sua vez, é um caminho único que percorre férteis intuições diversas. Veja: o caminho da sabedoria epicurista e os da sabedoria taoísta são um só e mesmo caminho: “(...) Quem poderá livrar-se do sucesso e da fama/E descer e perder-se entre a massa humana?/Esse fluirá como o Tao/Invisível, caminhará como a própria vida/Sem nome, sem lar/É simples e sem exigências/Aparentemente um tolo/Seus passos não deixam marcas/(...)Esse é o homem perfeito/Seu barco está vazio”. Chuang-Tzu. In: Thomas Merton, A via de Chuang-Tzu.

- A SOLDÃO NO YOU TUBE, PARA TE AJUDAR A CURTIR A SUA.
Tecle:
- La solitude. Barbara.
- Ma solitude. Serge Reggiani.

UM POUCO DE PARACELSO NA VEIA NÃO FAZ MAL A NINGUÉM.

- Palavras rebuscadas não tornam um homem sábio ou sagrado, mas uma boa vida o aproxima de Deus.

- Deus exige de nós o nosso coração, e não a cerimônia, pois estas fazem com que a fé nele pereça. Se procuramos por Deus, devemos seguir adiante, pois na igreja não o encontramos. Nosso jejuns, missas, vigílias e todo o resto nenhum efeito produzem sobre nós.

- Aquele que declara e pronuncia seu discurso como a Palavra de Deus peca contra o Espírito Santo. Acaba ouvindo não o que Cristo diz, mas o que ele diz.

- Fui escolhido por Deus para extinguir as fantasias dos trabalhos falsos, de palavras enganosas e presunçosas, sejam palavras de Aristóteles, Avicena, Mesuë, ou dogmas de seus seguidores.

- Se uma criança estiver predestinada a viver apenas 10 horas, seus planetas corporais completarão todos os seus circuitos, como fariam se tivesse vivido por cem anos. Os planetas corporais de um homem de cem anos, por outro lado, realizam exatamente o mesmo número de circuitos de uma criança que sobrevive 10 horas, mas a uma velocidade menor.

-Os santos se encontram no céu e não na madeira.

- Aquele que for incapaz de ser seu próprio mestre não deve viver sozinho.

- A mulher é muito superior ao homem. O homem é, para ela, o que a pêra é para a árvore. A pêra cai, mas a árvore permanece de pé.

- Ninguém pode se curar apenas com a fé, a não ser que a doença tenha sido, desde o princípio, imaginária.

- Em todas as escolas alemãs não se consegue aprender tanto quanto na feira de Frankfurt.

- Eu sou diferente. Que isso não o perturbe.

Paracelso. (Philip Theophastus Bombastus von Hohenheim (1493/1541). In: Philip Ball, Médico do demônio, Paracelso e o mundo da magia e da ciência renascentista. Paracelso foi um desses controvertidos e polêmicos gênios que a humanidade de vez em quanto produz. Viveu na fronteira entre o mundo medieval e a era moderna. Foi um misto de médico, alquimista, filósofo e charlatão, muito além de sua época e de seus semelhantes. Foi ele que mandou gravar em seu brasão de família: “não siga a outro, aquele que pode seguir a si mesmo”. Bingo!

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segunda-feira, 23 de maio de 2011

2005 - Amanhecer no Leme

O vazio é quieto, é tranquilo, é sem sabor.
O silêncio, a não-ação; esta é a medida do céu e da terra.
Este é o perfeito Tao. Os sábios encontram aqui
seu lugar de repouso.
Repousando, estão vazios.

Do vazio vem o não-conhecido.
Daí, o conhecido, as coisas individuais.
Assim, do vazio do sábio surge a quietude.
Da quietude, a ação, da ação, a realização.

Fértil por muitos anos,
a alegria faz tudo despreocupadamente,
porque o vazio, o quieto, o tranquilo,
o silêncio e a não-ação,
eis a raiz de todas as coisas.
Chuang-Tzu




REFLEXÕES PROFANAS.

- O real nunca é igual, e cada um nunca é só um.

- Quando os caminhos do pé e os caminhos da cabeça são um só caminho, então, o caminho do pé é um caminho de sabedoria.
Em tempo: “caminhos do pé” significa: “Uma embriaguez acomete aquele que longamente vagou sem rumo pelas ruas. A cada passo, o andar ganha uma potência crescente; sempre menor se torna a sedução das lojas, dos bistrôs, das mulheres sorridentes e sempre mais irresistível o magnetismo da próxima esquina, de uma massa de folhas distantes, de um nome de rua”. "O Flâneur". In: Walter Benjamin, Charles Baudelaire, um lírico no auge do capitalismo. Obras escolhidas, vol. III. Significa também “Flanar é ser vagabundo e refletir, é ser basbaque e comentar, ter o vírus da observação ligado ao da vadiagem (...) Oh! Sim, as ruas têm alma. Há ruas honestas, ruas sinistras, ruas nobres, delicadas, trágicas, depravadas, puras, infames, ruas sem história, ruas tão velhas que bastam para contar a evolução de uma cidade inteira (...) Qual de vós já passou a noite em claro ouvindo o segredo de cada rua? Qual de vós já sentiu o mistério, o vício, as idéias de cada bairro?”. In: João do Rio, A alma encantadora das ruas. E significa ainda: “Transeuntes eternos por nós mesmos, não há paisagem senão o que somos”. Fernando Pessoa, O livro do Desassossego. “Caminho do pé”, portanto, é próprio daqueles que perambulam e, porque perambulam - a rua como paisagem e espetáculo -, sonham, e porque sonham, perambulam. Poetas do ócio cotidiano. Ociosos sonhadores que atualizam o (seu) presente. Quanto mais sonham, mais caminham, quanto mais caminham, mais sonham. Quanto mais sonham e mais caminham mais si percorrem. Passeiam pelo real para imaginá-lo, imaginando-si. O exterior a si como interior de si.

- Um pouco menos de ortodoxia e um pouco mais de poesia fariam um bem danado a esse mundo.

- No jardim de Epicuro o ser frutifica.
(“Não fazia os seus cursos a certas horas, mas passava todo o dia no jardim, falando familiarmente com uns e com outros, de modo que não se via nele um mestre rodeado de discípulos, mas um grupo de amigos que filosofavam juntos”. In: J. Mewaldt, Pensamentos. Epicuro).

EPICURO

E então,
“Sem sofrimentos físicos ou perturbações da alma”,
morreu Epicuro:
Bebendo vinho,
imerso numa banheira de água quente.
(Isso é que é sabedoria!).

(Para Epicuro, o prazer é “ausência de sofrimentos físicos e perturbações da alma”. Epicuro, Carta sobre a felicidade (a Meneceu).

SOBRE NIETZSCHE.

Pensou a existência no extremo do possível.
Filósofo, escritor e músico, jamais deixou de celebrar a vida.
Perambulou por cidades, hotéis e pensões baratas.
Caminhou por prostitutas anônimas, por ruas e becos.
Caminhou por uma praça onde enlouqueceu definitivamente.
Caminhou por si próprio,
como ninguém.
“Como ninguém” significa que o filósofo caminhou como um ninguém, isto é, caminhou como o sábio.

SOBRE KANT.

Diariamente, depois do almoço, sob chuva ou sol, o filósofo caminhava de sua casa em Königsberg - cidade de onde nunca saiu - até o campanário da fortaleza de Friedrichsburg "seguindo sempre o mesmo caminho, batizado pelos moradores 'caminho do filósofo'. Sabia-se a hora sem ter necessidade do campanário: o filósofo passava...". In: Jean-Baptiste Botul, A vida sexual de Immanuel Kant.
Kant "jamais levava companhia, em parte para retomar suas meditações, em parte porque desejava respirar exclusivamente através das narinas, coisa que não poderia fazer se fosse obrigado a abrir a boca continuamente na conversa. A razão para tal desejo era que o ar atmosférico, percorrendo um circuito mais prolongado, consequentemente chegava aos pulmões num estado de menor rudeza, e a uma temperatura um pouco mais elevada, apresentando menor probabilidade de irritá-los”. Thomas De Quincey. Os últimos dias de Immanuel Kant.
Quanta disciplina e método o germânico caminhante ergueu em torno de si mesmo. Uma mente rigorosa que se embrenha pelos abismos de si necessita de rigor para sobreviver as exigências de seu próprio destino, isto é, de seu próprio caminho, isto é, de si mesmo.

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terça-feira, 17 de maio de 2011

REFLEXÕES OCIOSAS.

- Deus mora no esgotamento da linguagem.

- Trata-se de trocar o blá-blá-blá do mundo pelo seu silêncio: enquanto o ocidental fala para construí-lo, o oriental o escuta para saber o que ele é.

- A meditação é um pensamento que se debruça sobre si próprio... pensando nãopensamentos.

- A yoga é um pensamento de um corpo que se debruça sobre si próprio... pensando suas possibilidades enquanto corpo.
(A yoga agora virou yôga, como se o acento circunfléxico devolvesse, por si só, respeitabilidade à essa prática milenar cuja seriedade as academias e ashrans da moda cotidianamente destroem).

- Imperativo da existência: não somos nada; sejamos, pois.
SEM MESTRE, SEM FÉ
Onde não há dogma,
não há culpa.
Onde não há mestre,
o saber viceja.
floresce o ser.

O ZEN
Filosofia da quietude.
Prática de mansidão.
Metafísica do silêncio.

(“O cristianismo nasceu das palavras de Jesus, o Zen brotou de um silêncio de Buda.” Paulo Leminski. “Fuyú (inverno)”. In: Paulo Leminski, Matsuó Bashô.

KOAN PROFANO.
Como é a fala do silêncio que,
porque não fala fala?


A TERRA PROMETIDA
Mas não,
no limite de cada experiência
- abismo, vertigem -
nada é fixo ou permanente,
nada é certo ou previsível.
Sem dúvida, desespero e solidão,
a alma não se move.

SABEDORIA DE VIDA.

- Dentro, quando se caminha pra fora, e fora, quando dentro. Inútil perseguir gurus na Índia, perda de tempo recitar mantras em Katmandu, bobagem gastar solas de pé em peregrinações à Santiago de Compostela. Turismo é bom, mas o sábio de si mesmo sabe que o que sabe, sabe por conta própria.

SABEDORIA CHINESA.

- Um dia, quando Hüen Sha ia começar um sermão para um grupo de monjes, ouviu-se um passarinho que cantava numa árvore próxima. Então, Hüen Sha desceu do púlpito comentando que o sermão já havia sido dado.

- Indagado sobre a natureza de Buda, respondeu o mestre Zen: “é como cavalgar um boi à procura do boi”.

- Velho ditado chinês: quando o homem errado usa o método certo, o método certo atua de modo errado.

A ILUMINAÇÃO PROFANA DO BUDA.

Não qualquer um - tronco -
nem qualquer uma - árvore -
O Buda sentado junto.
Dois seres:
Idéias entre si.

Só um sábio escolheria o tronco de uma árvore para sentar embaixo... e pensar com. Repare: toda a sabedoria de ser no mundo a partir do simples tronco de uma árvore simples: e o Buda, bem-aventurado... sentou-si bem embaixo dela! Bem, consta que Santo Agostinho também se converteu ao catolicismo embaixo de uma árvore. Rousseau também se iluminou - profanamente - embaixo de uma delas: “(...) senti minha cabeça sendo acometida por uma confusão que beirava à embriaguez. Uma violenta palpitação oprimia-me o peito. Não podendo mais respirar andando deixei-me cair sob uma das árvores da avenida. Passei ali meia hora numa tal excitação que, quando me levantei, vi que tinha molhado de lágrimas meu casaco sem perceber que as tinha derramado. Oh senhor, se pudesse um dia descrever apenas uma fração do que vi e senti embaixo daquela árvore"
. J.J. Rousseau. In: Ernst Cassire, A questão Jean-Jacques Rousseau.
É perfeitamente adequado, pois, que Buda e árvore si remetam e si confundam de modo a que não se saiba mais - na iluminação profana do Buda - onde começam-si e terminam-si. Porque, já então, não haverá mais Buda, nem tronco, nem árvore a serem diferenciados, percebidos e sabidos como tais.
Repare mais uma vez: um sujeito - como eu e você - que se ilumina em baixo de uma árvore! Pense nisso, abrace uma delas, experimente, sente-si você também embaixo de uma árvore! Quem sabe.... Construa uma história para a iluminação profana do Buda, fazendo dela - é claro! - a história da sua própria iluminação profana.
Sendo isso e assim, essa é, precisamente, a chave da porta que se abre para um ou outro lado, para dentro ou para fora. Depende de quem?... bem, nesse caso, não se esqueça de mantê-la sempre aberta... pra dentro, é claro! Mas, em todo caso, não se preocupe: os caminhos que levam a iluminação profana são muitos e são todos porque, no fim das contas, não há caminho algum que leve a iluminação profana: trata-se, sem dúvida, de uma terra sem caminhos. (Se é que você me entende...).

SABEDORIAS PROFANAS

- Convicções são inimigos da verdade mais perigosos que mentiras. Nietzsche.

- Retribui-se mal um mestre, quando se permanece sempre e somente discípulo. Nietzsche.

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sexta-feira, 13 de maio de 2011

REFLEXÕES OCIOSAS

- Câncer: meu corpo adoeceu. Minha alma não.

- Câncer: enquanto der, to curtindo.

REVISITANDO BLOG


1) - VIDA
Tenho uma doença sem-vergonha.
Mas continuo fofo, dizem,
Perambulando por aí.

É que levo a vida “como Deus é servido”.
Curto como sei,
e não reclamo.

2)- O QUE VELA POR TODOS
Virtuosos não caminham por conta própria.
Monges imaculados não vão para o nirvana.
Castos, pobres-de-espírito, tolos e bem-pensantes
não percebem que, se dobrarem a esquina,
chegam ao Paraíso.

(E velando por todos,
Ele,
Aquele que não existe).

Zen é quando o sentido se desvenda pelo avesso...

...Koan é quando a ausência de sentido... é o próprio sentido.



Já expliquei em um post anterior o que é um koan. Aqui vai mais uma explicação bem suscinta: o koan é uma parábola, uma historieta, uma piada, uma pergunta, enfim, que o mestre faz ao discípulo com a finalidade de quebrar sua razão e, assim, fazer com que ele experimente uma outra realidade, além dessa comum, usual, corriqueira, meramente racional. O pressuposto é que se o discípulo encontrar a resposta, ele se ilumina. Por exemplo: qual é o som de uma só mão batendo palmas?
O KOAN
Atalho para o abismo.
A vertiginosa via intuitiva cujo sentido
- o fundo do poço -
não se encontra em lugar algum.

(O poço... sem fundo,
E o fundo... sem poço).

KOAN PROFANO
O que é que está onde nada há a ser buscado ou encontrado?
Onde o que busca, não é diferente daquilo que busca?
E o que é encontrado já está naquele que encontra?
O fim dessa busca, inevitavelmente, aponta para o seu início. Quer dizer: “olho vivo e faro fino.” (Personagens de desenho animado curtidos em deliciosas manhãs de puro ócio diante da televisão. A propósito:
nunca entendi esse conceito de “ócio criativo”. Para mim, “ócio criativo” não passa de ócio culpado. A criatividade, de fato, não pertence ao universo de possibilidades inerentes ao ócio, mas às do trabalho. Criatividade é fazer; ócio é não-fazer. “Ócio criativo” é como o hobby, essa invenção americana que convence você a trabalhar enquanto descansa... do trabalho. E viva Rimbaud que aos dezessete anos já havia percebido as armadilhas do trabalho: “Pedi-lhe que me indicasse ocupações pouco absorventes porque o pensamento reclama grandes períodos de tempo”. "O trabalho está mais longe de mim, do que minha unha está de meu olho”. A. Rimbaud, “Carta a Paul Demeny” e “Carta ‘martírica’ a Verlaine”. In: Ivo Barrosso, Arthur Rimbaud. Correspondência).

A LOUCURA E O KOAN COMO LOUCURA.
A loucura e a loucura do koan têm em comum uma linguagem simbólica cujo sentido jaz oculto no inconsciente. São linguagens fechadas, isto é, dependem de um código próprio de acesso, uma interpretação para que seus conteúdos emerjam com as verdades que de são portadores. Linguagens que proporcionam - a nós cidadãos aparentemente sãos - um vertiginoso mergulho nos labirintos e abismos de nós mesmos. (Já o que os separa, é que um - o Koan como método dentro do Zen - retorna desse mergulho. Já a outra - a loucura -, bem... a outra, não).
É como se ambos nadassem num mesmo oceano de subjetividades, embora um - o koan - emerja dessa experiência com um significado, enquanto o outro - o louco - se afoga num mergulho sem retorno - ainda que pleno de significado interno.
Na verdade, delirando e subvertendo os conteúdos usuais da razão, o koan dissolve qualquer possibilidade interna de controle, despertando e desencadeando o que mais tememos: nossa própria e singular loucura, pois se a razão nos assegura que somos todos sãos, que podemos conviver e suportar a loucura de alguns como uma exterioridade que não nos é própria enquanto sujeitos singulares, o koan postula o contrário: que somos todos loucos, porque somos o que não pensamos que somos, loucos também, pelo inverso e pelo avesso de nós mesmos.
Nada aterroriza mais a razão que o delírio do pensamento. “Acho que a razão moderna é semelhante àquela concepção medieval da terra chata. Se a gente se arriscar muito além das fronteiras, corre o risco de cair no abismo da loucura. E as pessoas morrem de medo disso. Acho que o medo da loucura é comparável ao medo que as pessoas tinham de despencar de cima da terra”. In: Robert M. Pirsig.“Capítulo 14”. Zen e a arte da manutenção de motocicletas.

KOAN PROFANO.
Loucura é o oposto de razão.
Razão é loucura.

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sábado, 7 de maio de 2011

REFLEXÕES OCIOSAS.

- Segundo Leibniz, se existe uma idéia de Deus, então Deus existe. E agora?

- Toda verdade não é apenas provisória. Toda verdade é, também, sempre parcial.

POESIAS SEM DOR

BALANÇO DE VIDA
Par jeunesse
j’ai perdu ma tendresse
et ma delicatesse

Em compensação,
Botei meus ya’s ya’s out.


ORIENTE/OCIDENTE
O que é loucura no Ocidente
é santidade no Oriente.

E aí,
Vai de Buda,
Ou vai de Freud?

Essas duas poesias já foram postadas antes no blog. Mas é que gosto muito delas, de modo que espero que as centenas de novos leitores que tenho também possam apreciá-las.

SABEDORIAS PROFANAS

- A estrada do excesso leva ao palácio da sabedoria. Willian Blake.

- Cuidado com o homem de um livro só. Sto. Tomás de Aquino.

- Como é ser morcego? (...) Ser um morcego vivo é estar cheio de ser. Ser plenamente morcego é igual a ser plenamente humano, o que quer dizer também estar cheio de ser. Ser-morcego no primeiro caso, ser-humano no segundo, talvez, mas essas considerações são secundárias. Estar cheio de ser é viver como corpo-alma. Nosso nome para essa experiência de ser pleno é alegria. J. M. Coetzee.

- Nunca vi nada que fosse feio. Claude Manet.

Hai-Kai é um verso que despeja delicadeza e poesia onde, antes, só havia realidade.
Por exemplo, esse hibisco e esse edifício são hai-kais por imagens.
Repare: mostram o que todos vêem, de uma maneira - delicada e poética - que ninguem vê.
A propósito: dias depois, voltei na rua onde havia tirado a foto do hibisco e .... nada de hibisco. Mas o porteiro do prédio, muito compenetrado, me explicou que ele tinha sido podado para... “proteger o poste”.
Já a foto do prédio, de 1976, foi feita do segundo andar da biblioteca da PUC em direção da rua Marquês de São Vicente. Desde então não voltei mais lá, mas sei que hoje, entre a biblioteca e esse prédio, há um enorme vazio... com um estacionamento no meio.
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segunda-feira, 2 de maio de 2011

BUDISMO


Atenção: essas são observações pessoais, produto de uma leitura própria. O Budismo,como se sabe, é formalmente ruma eligião. Entretanto, a minha hipótese - leiga e laica -, é que a religião não esgota as diversas propostas - existenciais, filosóficas e psicológicas - do Budismo. Ao contrario, a religião simplifica e empobrece seus conteúdos.

1
Para as religiões formais, só há salvação mediada - dentro, através - por elas. Um contrato firmado no presente para cumprimento no futuro. Já o Buda, bem, o Buda intuiu o contrário: o Budismo é um contrato entre as partes, cujo cumprimento exige um investimento aqui mesmo, isto é, no presente. De fato, a mensagem final do Buda pode ser resumida na seguinte afirmação:
Saber de si, salva!
Ver-se como se é, liberta!
(Cinco mil anos antes de Freud .... Bem, em todo caso, ser o que se é não é fácil; trata-se de conquista árdua e dolorosa).

2
Religiões formais afirmam que a salvação é uma possibilidade e uma promessa, até mesmo um direito posterior - bem entendido - à vida material: isto é, é preciso que a vida cesse para que se possa salvá-la; é preciso que o sujeito morra, para que possa salvar-se. Religiões formais consideram a salvação da vida do sujeito depois que ela cessa, depois que ele deixa de sê-lo!
(Quer dizer, o direito de salvar-se você ganha ainda nessa vida, mas o desfrute propriamente dito, ah!, amigo, esse, só depois, lá no céu).

A SALVAÇÃO PESSOAL SEGUNDO O BUDISMO
I
A salvação está na própria vida,
antes que ela - vida - cesse.
Antes que ele - sujeito - deixe de sê-lo.
Onde as religiões formais afirmam:
Perca sua vida, para salvá-la!
O Budismo ordena:
Salve sua vida, antes de perdê-la.

(Salvar-se é crescer, diz a psicanálise.
Salvar-se é curar-se da vida, diz o budismo.
Salvar-se é curar a alma, diz Epicuro.

Salvar-se significa, portanto, crescer; que significa, portanto, possuir-se; que significa, portanto, curar-se; que significa, portanto... salvar-se).

3
O Buda insistia na inutilidade de igrejas, cultos e cerimônias como caminho para a Salvação Pessoal, bem como na descrença de qualquer autoridade externa como meio para alcançá-la. O Budismo é uma prática solitária e individual que não só não inclui idéia alguma de salvação posterior, como, muito menos, coletiva. (A idéia de comunhão é tipicamente ocidental e cristã: “Os franciscanos foram os principais difusores da idéia de que ninguém se salva sozinho, que é toda a humanidade, toda a criação que deve se salvar ela própria”. (Jacques Le Goff, São Francisco de Assis).
O budista tem consciência de que ninguém está habilitado a salvar ninguém; ele sabe que cabe à cada um dar conta de si próprio, e que não há nada a ser salvo além ou fora de si mesmo. O Budismo, em consequência, abriga a idéia de que “religião” é menos uma fé praticada em comum, e mais um exercício autônomo e solitário de reflexão pessoal. Pura imanência.
O Buda descobriu que a Salvação Pessoal não é barganha, mas relação e investimento do sujeito sobre si mesmo. Veja só o que disse Foucault a respeito das salvação (num outro contexto, referindo-se a outros objetos, evidentemente, mas, de qualquer modo, nos dando um pista sobre para onde uma abordagem laica da salvação pode apontar): “A salvação é, portanto, uma atividade permanente do sujeito sobre si mesmo, que encontra sua recompensa em uma certa relação consigo ao tornar-se inaccessível às perturbações exteriores e ao encontrar em si mesmo uma satisfação que de nada mais necessita senão dele próprio”. (In: Michel Foucault, A hermenêutica do sujeito).
A originalidade do Budismo foi inserir a idéia de salvação num contexto puramente existencial, material e psicológico. Única e exclusivamente, sua preocupação é a salvação do sujeito através da consciência de sua condição material. Produto de intuições no campo abrangente da espiritualidade, a salvação se pratica, se exerce e se exterioriza no dia-a-dia, sem testemunhas ou autoridades.
O Buda descobriu que salvar-se de si implica encontrar a si. Essa é a boa notícia. A má, é que si é um lugar difícil de ser encontrado, e ninguém pode fazer isso com ou por você:
Si, amigo, é um caminho solitário.

O BUDISMO
I
Mais - uma doutrina para ser pensada.
Menos - uma religião para ser rezada.

II
Uma linguagem espiritual,
- discursos -
onde escolas espirituais diversas encontram abrigo,
suporte e sabedoria.
(Jung dizia que o Budismo é “um imenso mundo-pensamento”. In: Daisetz Teitaro Suzuki, Introdução ao Zen-Budismo).

III
O Budismo é menos religião pra fora que intuição pra dentro.
- Proposta de mergulho na condição humana -
Mais psicanálise que religião.
Mais consciência que fé.
Mais aprendizado, que dogma.
Mais sabedoria, que devoção.

IV
Sim,
o Budismo envolve uma terapia.
ele nos cura de nós mesmos.
Cura da vida.
(A idéia de que o Budismo “cura da vida” é de H. Zimmer: “[o Buda] nos cura da vida da maneira como a vivemos. (...) Como primeira verdade, ele determina que o ser humano não está são e que sofre. Ele afirma isso de maneira serena, sem perguntas acerca de qualquer culpabilidade, sem pathos de origens metafísicos. O que esse sofrimento humano pode ser, não é ensinado através de especulações, mas da observação simples sobre a sua existência finita, limitada e condicionada (...) O Buda se situa frente ao ser humano, algo assim como o psicoterapeuta frente ao paciente que se crê sadio, ao passo que o olhar do médico percebe todas as suas tensões e complicações, toda a gravidade do caso. O diagnóstico é que essa vida está cheia de sofrimento, e que a causa principal - da qual emergem todos os sintomas deste diagnóstico - é a ignorância (...) O diagnóstico budista qualifica como patológico todo essa vida automática. Um estado de sofrimento que poderia ser sanado”. Tradução pessoal. In: Heinrich Zimmer, Yoga y Budismo).

V
Não há nada a ser salvo de nada, ninguém a ser salvo de ninguém.
A não ser o sujeito do próprio sujeito, é claro! (Salvar-se depende da capacidade de descobrir e de lidar com os outros de si mesmo - dentro de si).

VI
O Budismo é:
Uma relação direta e sem intermediários do sujeito com si mesmo.
Uma prática individual e solitária.
Uma intuição direta que não demanda qualquer ritual, nenhuma cerimônia, lugar algum de culto ou reverência.
(Erguer altares para Buda? Tudo bem, o Budismo tolera nossas humanas fragilidades...).