sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

NUM CORREDOR DE HOSPITAL

- Suspeita de C.A.?
- Não, suspeita de câncer mesmo.

REFLEXÃO SEM DOR

Entenda:
Tenho uma doença, mas não estou doente.
(Indamáis, tenho muitas mãos me segurando).

SABEDORIAS PROFANAS

- A abolição da religião como felicidade ilusória do povo é a exigência que formula a sua felicidade real. Karl Marx. “Crítica da filosofia do direito de Hegel”.

- O homem nasceu livre e em toda parte está a ferros.
Jean Jacques Rousseau. Do contrato social.

- Tranqüilidade na desordem significa perfeição.
Roland Barthes.

- É um belo problema, o momento em que os seres humanos percebem que não pertencem a nenhum reino que não este mesmo e não têm nenhum Deus a quem possam rezar. Lesley Chamberlain, Nietzsche em Turim.

- Aqueles que, pela cessação íntima de toda operação intelectual, entram em união íntima com a luz inefável... não falam de Deus senão pela negação.
Dionísio, o Aeropagita.

- Continuamos a acreditar que o universo deva ser lógico e belo; apenas pusemos de lado a palavra ‘Deus’.
Stephen Hawking.

- Afinal, se o seu Jesus teve de andar sobre as águas, é porque devia ter uns argumentos bem fracos!
Marcel Conche. In: André Comte-Sponville, O espírito do ateísmo.

A ILUMINAÇÃO DO BUDA

SEGUNDO JACK KEROUAC
Seus ossos poderiam apodrecer e seu tendões atrofiar-se e corvos bicarem seu cérebro abandonado, mas esse homem semelhante a um deus não se levantaria daquele lugar sobre o leito de grama debaixo da figueira até ter resolvido o enigma do mundo. Uniu os dentes e pressionou a língua contra eles. Concentrou sua inteligência radiante e deixou a consciência deslizar para a intuição interna do insight. As mãos gentilmente entrelaçadas, respirando como um bebê, de olhos fechados, imóvel e imperturbável, ele intuiu, à medida que o ocaso desceu sobre o terraço de terra em cima do qual ele estava sentado. Embora toda a terra pudesse ser movida e abalada, esse lugar ficaria fixo e estável. Era o mês de maio na Índia, na hora conhecida como ‘poeirada da vaca’, quando o ar fica dourado como grãos, cálido e sonhador, e todas as coisas e bestas exalam sua fé em crepúsculos de calma mental natural.
Muitas palavras foram escritas sobre esse momento sagrado no agora famoso local embaixo da árvore bodhi, ou árvore da sabedoria. Não foi uma agonia no jardim, foi uma bem-aventurança debaixo da árvore;não foi a ressurreição de nada, mas a aniquilação de todas as coisas. Veio a Buda naquelas horas a compreensão de que todas as coisas vêm de uma causa e vão para a dissolução e, portanto, todas as coisas são impermanentes, todas as coisas são infelizes e, por conseguinte e mais misterioso, todas as coisas são irreais.

Jack Kerouac, Despertar: uma vida de Buda. Jack Kerouac (1922/1969) foi um escritor que, junto com Allen Grinsberg, William Burroghs, Gregory Corso, Lawrence Ferlingueti e outros criou a partir da década de ‘50 um estilo literário que ficou conhecido como Beat, dando origem a chamada geração dos Beatnicks. Muita bebida e muita droga depois, Kerouac ficou meio reaça, apoiou a guerra do Vietnam e, contra os hippies, não conseguiu perceber que eles, finalmente, realizavam tudo aquilo que nos seus romances ele tanto propôs. Nesse meio tempo, estudou a fundo o Budismo, tendo escrito especificamente esse, sobre o despertar do Buda. Na verdade, todos os livros de Kerouac foram influenciados pela doutrina budista. Gosto especificamente de Satori em Paris, Tristessa e Os vagabundos do dharma. Quanto a On the Road, confesso que nunca li: é que concordo com Borges quando diz que as Mil e uma noites é um livro tão vasto que não é necessário lê-lo. Jack kerouac morreu em consequência de um alcoolismo crônico.

SEGUNDO HERMAN HESSE
Olhou o mundo a seu redor, como se o enxergasse pela primeira vez. Belo era o mundo! Era variado, era surpreendente e enigmático! Lá o azul; acolá o amarelo! O céu a flutuar e o rio a correr, o mato a eriçar-se e a serra também! Tudo lindo, tudo misterioso e mágico! E no centro de tudo isso achava-se ele, Sidarta, a caminho de si-próprio. (...) O azul era azul, o rio era rio e, posto que, nesse azul e nesse rio abrangidos por Sidarta existisse, escondida, a idéia de unidade, era, contudo, peculiar do Divino ser amarelo aí e azul lá, céu ali e mato acolá, e também ser Sidarta, aqui, neste lugar. O sentido e a essência não se encontravam em algum lugar atrás das coisas, senão em seu interior, no íntimo de todas elas. (...) Já não ia em busca do essencial. Já não visava o além. Como eram lindos os astros e a lua, os arroios e as ribeiras, as florestas e os penedos, a cabra e o besouro dourado, a flor e a borboleta! (...) Sidarta espreitou o povo dos macacos enquanto percorriam a alta abobada formada pela ramagem da selva; observou-os como pulavam de galho em galho; escutou os gritos ávidos, ferozes. Viu um carneiro a correr atrás de uma ovelha para cobri-la. Ao entardecer, no juncal da lagoa, espiou um Lucio que ia à caça, acossado pela fome, e o cardume de peixinhos apavorados, a saltar das águas, nervosos e brilhantes. A violência da perseguição provocou turbilhões passageiros que exalavam um perfume impregnado de paixão e vigor. Como era belo o mundo para quem o olhasse assim, ingenuamente, simplesmente, sem procurar nada nele!

Herman Hesse, Sidarta. Escritor alemão (1877/1962) cujos livros abriram minha consciência e enriqueceram minha trajetória pela Contracultura dos anos ‘60, tais como Sidarta, Demian, O Lobo da estepe, Viagem ao Oriente e tantos outros.

SEGUNDO EU MESMO
- E então... andando, vagando, perambulando, o Buda, enfim, iluminou-se, isto é, salvou-se de si mesmo por si mesmo!
Entretanto, a história tradicional do Budismo conta que ele se iluminou meditando sentado junto ao tronco de uma árvore (é fértil e rico de significado que a mitologia budista tenha escolhido a árvore como símbolo da iluminação do Buda. De fato, a árvore é um símbolo arquetípico universal de expansão da consciência e crescimento espiritual).
Bem, mas o Buda se iluminou, na verdade, não quando, mas porque estava sentado junto a um sólido tronco de uma velha árvore! Sim, foi com ele - o tronco -, e sim, embaixo dela - a árvore -, que o Buda percebeu o sentido da vida, ou, pelo menos, da sua vida. Percebeu que a salvação - e a sabedoria que dela decorre - está dentro, isto é, numa árvore interna: dentro, como seu próprio tronco (dentro, quando caminha pra fora, e fora, quando dentro. Inútil perseguir gurus na Índia, perda de tempo recitar mantras em Katmandu, bobagem gastar solas de pé em peregrinações à Santiago de Compostela).
E o Buda, então, salvou-se, isto é, iluminou-se quando percebeu que a solidão desse solitário tronco externo era a mesma de seu solitário tronco interno.
E sentou-se, então, o Buda, na solidez do tronco externo de uma solitária árvore externa: sentou-si.
E sentou-si, pois, o Buda - não qualquer tronco, não qualquer árvore - com seu tranqüilo tronco interno nessa tranquila árvore externa. Com eles, obteve a concentração e o equilíbrio para intuir sua doutrina. Foi o tronco dessa árvore - um sábio tronco de uma árvore sábia – que deu força e energia para ele transmitir seu projeto original de Salvação Pessoal.
Sim, o Buda foi penetrado pela sabedoria que emana de velhos troncos internos e externos de sólidas árvores externas e internas.
(Pois só um sábio escolheria o tronco de uma árvore para sentar embaixo... e pensar com).

(A ILUMINAÇÃO PROFANA DO BUDA
Não qualquer um - tronco -
nem qualquer uma - árvore -
E o Buda sentado junto.
Dois seres:
idéias entre si
).

Foram eles - réles tronco de réles árvore - que transmitiram ao Buda a sua sabedoria existencial. Imagine!, toda a sabedoria de ser no mundo a partir do simples tronco de uma árvore simples.
E o Buda, bem-aventurado... sentou-si bem embaixo dela!
E Sidarta Gautama, então, salvou-se, isto é, iluminou-se, deixou de ser Sidarta para ser Buda e, sendo Buda, continuou sendo Sidarta quando soube que não era um eu pessoal, que não tinha realidade por si mesmo, nem estava separado de outros eus.

Originalmente, devo o conceito de “Iluminação Profana” a Walter Benjamin. Eu já havia intuído e escrito a respeito de um a iluminação que não fosse depositária de práticas religiosas e devocionais. Me deparar, então, com esse conceito “materialista e antropológico” de Benjamin foi uma surpresa e um presente que os deuses da filosofia me concederam. Ver: “O surrealismo. O último instantâneo da inteligência européia”. In: Walter Benjamin, Obras escolhidas, Vol. 1.

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011



Janeiro de 2010. Pós-operatório, perdi 12 quilos, às vezes me sentia fraco e meio tonto. Aí me lembrei das minhas bengalas; ao longo do tempo, sem saber muito bem porque, sempre que podia ou via alguma, comprava. Tenho umas quatro ou cinco.
Bem aí pensei: é agora! As pessoas ficavam meio apreensivas quando me viam com uma, perguntavam se seu estava bem, qual a razão dela etc. (Até o oncologista me perguntou, preocupado, quando eu, solenemente, encostei-a na sua mesa). Essa era, justamente, a “deixa” que eu ficava esperando para explicar que ela atendia a dois motivos paralelos e igualmente importantes:
- Compor com dignidade e charme o novo personagem que surgia das cinzas.
- Tal como os charutos (vide Freud), as bengalas (vide Borges), dependendo de quem as usa, são uma metáfora da sabedoria.
(Conjectura sem dor: à Freud, faltou a bengala; à Borges, o charuto. Isso quer dizer que, se eu conseguir reuní-los num só ato, caraca!, minha vida terá sido um sucesso para mim mesmo. Não vejo a hora...).

O SÁBIO E O EQUILIBRISTA; OU, O EQULIBRISTA DEVE CAIR?

Cair: ausência de lugar fixo.
Cair...
para um ou outro lado: O sábio perde as certezas do eu.
Cair...
para um ou outro lado - indiferente - o sábio não teoriza.
Cair...
para um ou outro lado - sereno - o sábio segue sua natureza.
Cair...
para um ou outro lado - desapego - o sábio sabe de si, nada o constrange.
Cair...
para um ou outro lado - seguro - o sábio não tem objetivo.
Cair...
para um ou outro lado - disponível - para o sábio tudo é igual.
Cair...
para um ou outro lado - romper conteúdos que mantêm a mente nos limites da razão.
Cair...
para um ou outro lado: desaprender, livrar-se de manhas e tramas.
Cair...
da corda bamba - nenhuma escolha. Irrepreensível.
Cair...
não importa se há caminho, caminho do meio, nenhum caminho.
Cair... e então,
Plenamente
Mergulhar no abismo de si mesmo!
(Todo sábio é um equilibrista: todo sábio cai).

Tinha pensado em fazer uma introdução à essa poesia, falando do Caminho do Meio” do budismo. Segundo a doutrina, o “Caminho do Meio” leva a sabedoria por manter o discípulo longe dos extremos (nem a vida fácil do príncipe, nem a ascese rigorosa do eremita).Tinha pensado em usar o equilibrista que se mantém na corda-bamba como metáfora. Pensei nessa introdução, porque tenho uma posição divergente: para mim, ao contrário, o “Caminho do Meio” se confunde com a razão, o bom-senso e o senso-comum. Ele implica escolha e, assim, permanece no campo restrito e minado da razão cotidiana. O equilibrista, isto é, o discípulo de si mesmo, o sábio profano tem que cair. Perder as rédeas de si mesmo, se descompromissar, isto é, virar seus compromissos pelo lado do avesso. Esse argumento, de qualquer modo, está desenvolvido no meu livro sobre o zen, aquele “que não termina nunca”.
Bem, cair, portanto, é uma estratégia de movimento.
Nesse caso, inevitavelmente, é preciso que o equilibrista - isto é, o discípulo de si mesmo, isto é, o sábio - caia, sem esforço ou direção.

UM POUCO DE GEORGES BATAILLE NA VEIA NÃO FAZ MAL A NINGUÉM

- Estamos totalmente expostos somente quando nos dirigimos sem trapacear ao desconhecido. É a parte do desconhecido que dá à experiência de Deus - ou do poético sua grande autoridade.

- Meu princípio contra a ascese é que o extremo é acessível pelo excesso, não pela falta.

- Chegamos ao êxtase através de uma contestação do saber.

- A verdadeira poesia se encontra fora das leis.

- Apreendo soçobrando que a única verdade do homem, enfim entrevista, é de ser uma súplica sem resposta.

- “Si mesmo” não é o sujeito isolado do mundo, mas um lugar de comunicação, de fusão do sujeito e do objeto.

- Chamo experiência uma viagem ao término do possível do homem. Cada um pode não fazer essa viagem, mas, se ele a faz, isso supõe negar as autoridades, os valores existentes que limitam o possível.(...) Ir ao término significa pelo menos isto: que o limite, que é o conhecimento como fim, seja ultrapassado.

- O homem só possui a paz, fugindo.

- O essencial é o extremo do possível, onde o próprio Deus não sabe mais, desespera e mata.

- O extremo é o único ponto por onde o homem escapa de sua estupidez limitada – mas ao mesmo tempo para soçobrar nela.

- O extremo do possível supõe riso, êxtase, aproximação aterrada da morte; supõe erro, náusea, agitação incessante do possível e do impossível e, para terminar, quebrado, embora gradualmente, lentamente desejado, o estado de súplica, a sua absorção no desespero.

- Ironia! Que me chamem de panteísta, ateu, teísta!... Mas eu grito aos céus: “não sei nada (...) nada, absolutamente”.

- Somos talvez a ferida, a doença da natureza.

- A experiência é o colocar em jogo (à prova), na febre e na angústia, aquilo que um homem sabe pelo fato de ser. Caso, nessa febre, ele tenha qualquer apreensão que seja, não pode dizer: "eu vi isto, o que vi é tal"; não pode dizer: "eu vi Deus, o absoluto ou o fundo dos mundos", ele só pode dizer "o que vi escapa ao entendimento", e Deus, o absoluto, o fundo dos mundos não são nada se não forem categorias do entendimento.

- Só matamos o desejo dos objetos à condição de propor ao desejo um novo objeto.

- Além dos possíveis conhecidos, uma angustia tão grande habita o cinza do céu, da mesma maneira que um monge, a escuridão de um túmulo.

- Os pressupostos dogmáticos deram limites indevidos à experiência; aquele que já sabe não pode ir além de um horizonte conhecido.

- [A experiência interior] não leva a porto algum, mas a um lugar de extravio, de contra-senso.

- A experiência interior é um movimento em que o homem se coloca inteiramente em questão.


- Um homem que ignora o erotismo é tão estranho quanto um homem sem experiência interior.

- A experiência é o colocar em jogo (à prova), na febre na angústia, aquilo que um homem sabe pelo fato de ser.

- [Sobre os diversos enunciados da “experiência interior”] É preciso apreender o sentido deles a partir de dentro. Eles não são demonstráveis logicamente. É preciso viver a experiência, ela não é facilmente acessível, e mesmo, considerada de fora pela inteligência, seria preciso ver aí uma soma de operações distintas, algumas intelectuais, outras estéticas, outras, enfim, morais, e todo o problema a retomar: é somente a partir de dentro, vivida até o transe, que ela aparece unindo o que o pensamento discursivo deve separar.

- É através de uma íntima cessação de toda operação intelectual que o espírito se expõe.

- O instante crucial é o da morte; no entanto, desde que a ação começa, tudo está em questão, tudo está presente.

- Escrevo para apagar meu nome.

Georges Bataille (1897/1962) é um dos mais instigantes filósofos que a França produziu. Deu enormes contribuições no campo da filosofia, da literatura e da psicanálise. Lacan, por exemplo, deve muito a ele. Algum dia, quem sabe, ainda farei um estudo comparando-o com Nietzsche, pois acho que são muito semelhantes.
Veja só:
BATAILLE: E o que significa a pergunta sem angustia, sem suplício? No momento de ficar louco, a resposta aparece; como poderíamos ouvi-la, sem isso?
NIETZSCHE: Você tem que estar preparado para se queimar em sua própria chama; como se renovar sem primeiro se tornar cinza?
BATAILLE: O dramático (...) é simplesmente ser.
NIETZSCHE: Torna-te o que tu és.
BATAILLE: Só atingimos os estados de êxtase, ou de arrebatamento, dramatizando a existência em geral.
NIETZSCHE: É preciso ter o caos e frenesi dentro de si para dar a luz à uma estrela dançante.
Além do mais, Bataille foi também um escritor de mão cheia. É impressionante como os franceses - será que a língua ajuda? - sejam escritores ou filósofos, cultivam o estilo, a arte de bem escrever. Seus filósofos, por mais difíceis que sejam, dão uma aula de estilo. Talvez o melhor exemplo seja Foucault: como todos, não é um filósofo fácil de ler, entretanto, de repente, um parágrafo e, pronto, já valeu a viagem.
Bem, fiquei tentando recuperar a origem de cada uma dessas citações. Não posso afirmar com 100% de certeza, mas é quase certo que foram pescadas, ao longo do tempo, dos livros A experiência interior, A parte maldita, Teoria da religião e La religión surrealista.

sábado, 15 de janeiro de 2011

REFLEXÕES OCIOSAS

- Duvido, logo penso. A dúvida é a mãe da sabedoria.

- A diferença entre a sabedoria e a fé é o modo como cada uma funciona dentro de você.

- O real não se resume ao visível; o dito não esgota o dizível: viver é menor que o vivível.

- Nietzsche chama de “livre” essa vontade idiossincrática que se manifesta na vida cotidiana e se intensifica no ato de vivê-la; essa vontade que implica escolha, e cria seus próprios valores. Para ele,o inimigo mais terrível da verdade não são as mentiras, mas as convicções.

- Diante de tantas práticas que se pretendem únicas, disciplinas que se querem prontas, caminhos que se dizem exclusivos, verdades que se têm como definitivas, não deixa de ser um luxo, um privilégio e um prazer poder afirmar e desfrutar do que não se sabe.

- Graça, delicadeza e estilo: dar conta do que não se sabe, para dar conta de si.

- Toda poesia é transgressão. Todo poeta é marginal.

SABEDORIAS

CHINESA
- O sapo no fundo da poça não saberia falar do oceano, preso que está no seu buraco; O inseto que vive apenas um verão não saberia falar da neve, limitado que está a uma única estação. O homem letrado não saberia falar do Tao, prisioneiro que é de tudo que sabe. Chuang-Tzu.

BUDISTA
- Que o sábio não perturbe a mente dos não sábios em seu trabalho. Que trabalhe com devoção e mostre a eles a alegria do bom trabalho, e aqueles que estão sob a ilusão das forças da natureza se submetam a trabalhar essas forças. Que o homem que vê isso não perturbe aquele que não vê. Bhagavad-Gita.

- Tukaran, um santo da Índia, era um homem pobre que uma vez recebeu dez roletes de cana-de-açucar de presente. Em seu caminho para casa, ele deu nove dos roletes para mendigos, guardando um para si. Quando chegou em casa e contou para a sua esposa, ela bateu nele com o rolete restante.

CRISTÃ
- O reino dos céus não vem com aparência visível, nem se dirá ei-lo aqui ou ali, porque o reino de Deus está dentro de nós. In: Lucas:20,21.

- Quando fizeres de dois um, e quando tornares o interior como o exterior, e o exterior como o interior, e o acima como o abaixo, e quando tornares o masculino e o feminino uma e mesma coisa... então entrarás no Reino.
In: Elaine Pagels. Evangelho gnóstico de Felipe.

- Peça e lhe será dado; procure e encontrará; bata à porta, e ela lhe será aberta.
In: Mateus 7:7.

HAI-KAI QUE GOSTARIA DE TER ESCRITO

Sentado tranqüilamente, nada fazendo.
A primavera chega,
e a erva cresce por si própria
.
Alan Watts.

BERTRAND RUSSELL

- Periodicamente, a cada dois anos ou coisa assim, a Voltaire Society, uma sociedade de alunos de inclinação intelectual em Oxford, promovia um banquete com Bertrand Russel - o patrono oficial da sociedade. Na ocasião a qual me refiro, fomos todos a Londres e jantamos com Russell em um restaurante. Ele estava então na casa dos oitenta anos, e tinha a reputação de ser um ateu famoso. Para muitos de nós, a questão das opiniões de Russell sobre a imortalidade parecia premente, e perguntamos a ele: 'suponhamos que o senhor estivesse errado sobre a existência de Deus. Suponhamos que fosse tudo verdade, e que o senhor chegasse às portas do paraíso e encontrasse são Pedro. Tendo negado a existência de Deus durante toda a sua vida, o que o senhor diria a Ele'? Russell respondeu sem hesitar um só instante. 'Bem, eu iria até Ele e diria: o Senhor não nos deu provas suficientes’! (In: John R. Searle, Mente, linguagem e sociedade).

SOBRE DROGAS PSICODÉLICAS E ESTADOS ALTERADOS DE CONSCIÊNCIA

Esse texto foi retirado do livro Caminhos para Deus. Ensinamentos do Bhagavad Gita, de autoria de Ram Dass. (Ram Dass é, na verdade, Richard Alpert que ficou famoso na década de ‘60 quando, como professor de psicologia em Harvard, iniciou junto com Thimoty Leary, um laboratório para a exploração de estados alterados de consciência através da ingestão de drogas diversas, principalmente do LSD. Expulsos de Harvard, Richard - ou melhor, Ram Dass, “servo de Deus” - enveredou pelos caminhos da religião oriental, tornou-se discípulo de Maharijii e hoje escreve livros e dá palestras ao redor do mundo.
- Entre nós, aqueles que estiveram envolvidos na pesquisas com cogumelos e com o LSD na década de’60 experimentaram efeitos similares através dos psicodélicos. Eles nos abriram espiritualmente, foram realmente um sacramento. Aldous Huxley disse que eles foram “um presente gratificante da graça divina”.
Substâncias semelhante ao soma são mencionadas em vários sistemas hindus. No ashanga yoga de Pântagili, por exemplo, existem referências ao uso de substâncias químicas para alterar a consciência. Alguns especulam que cogumelos psicodélicos estavam na própria essência das práticas yogues. Essa foi a teoria de Gordon Wasson. Gordon Wasson é um micologista mas, antes de se especializar nessa área, foi vice-presidente da Morgan Guarantee Trust Company, em Nova York. Interessou-se pelos cogumelos sagrados conhecidos no México como teonanacatl - “a carne dos deuses”; eles são cogumelos psicodélicos que, com algumas poucas outras variedades, são capazes de provocar estados alterados de consciência. Após ter começado a trabalhar com o teonanacatl, Wasson se aposentou como vice-presidente da MGTC e começou a viajar pelo mundo estudando cogumelos e seus usos religiosos. Descobriu que havia “pedras de cogumelos” - pedras esculpidas em formatos de cogumelos - que estavam ligadas a religiões muito, muito antigas. Sua tese foi que os místicos yogues originais da Índia eram comedores de cogumelos das montanhas do norte que tinham descidos para o vale do rio Indo;mas os cogumelos sagrados não cresciam ali e eles, então, desenvolveram todas as práticas yogues - pranayama, hata yoga e raja yoga - para tentar reproduzir os mesmos estados de consciência que os cogumelos tinham originalmente proporcionada a eles.
E esse conhecimento não ficou limitado à Índia. Carl Heinrich, um etnobotânico de Santa Cruz, Califórnia, sugere que o “pão” que Jesus ofereceu na Última Ceia foi na verdade um cogumelo psicodélico chamado agário voador, que se parecia com um pão tipo pita e era apreciado por seu sabor e também pelos seus efeitos. As substâncias psicodélicas foram também utilizadas no Ocidente. Não existem mais muitas dúvidas de que os ritos entre os antigos gregos incluíam modos de alterar a consciência para “uma vida melhor através da química”. Parece que uma poção chamada kikeon, tendo como base a ergotina, era utilizada nos Mistérios de Elêusis. Cerca de três mil pessoas participavam ao mesmo tempo nos rituais em Elêusis, e Platão e Aristóteles estavam ente os iniciados.
- A situação que encaramos no momento é que a maioria das substâncias psicodélicas atualmente é ilegal. Quando as pessoas me perguntam o que penso sobre a política do governo em relação aos psicodélicos, sempre respondo que o mais razoável a fazer quanto a essas substâncias que alteram a consciência humana é educar as pessoas e não policiá-las. Trata-se realmente de bom senso preparar as pessoas para uma experiência psicodélica, talvez até ara licenciá-las, da mesma maneira como agimos antes de permitir que alguém dirija um veículo. Mas não devemos proibir ninguém de usar qualquer substância que escolher. É preciso respeitar o direito dos outros seres de alterar e explorar a sua própria consciência à maneira deles. Esta deveria ser a liberdade humana básica.
- A maneira como encaro a questão é que os estados de consciência estão sempre disponíveis se não os ocultamos por meio do apego a nossos próprios pensamentos. Todo ele está sempre disponível para todos nós – porém sabermos disso ou não, depende de quem imaginamos que somos.

Bem, no que me diz respeito, andei tomando uns LSDs na Europa (Amsterdam) e mais alguns poucos, por aqui mesmo, logo que voltei na década de ‘70. Também andei comendo uns cogumelos que catávamos nos ermos da Barra da Tijuca, eu e um americano mucholoco que conheci nessa época e, um pouco mais tarde, nos altos de Visconde de Mauá, catados junto as bostas dos bois que pastavam nos pastos da região.
Se alteram minha consciência?
Sei lá!, o que você acha?

quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

FELIZ 2011

A foto é antiga, mas pretende mostrar o que o ano de 2011 deve significar para todos nós.

Glaucia disse...

Mulher (a sua claro!), Sexo e Rock'n Roll
Livros
Filho, Filha, papos brabos ou não.
Livros
Queijos, vinhos e charutos.
Livros
Mozart, Jornais e TV.
Livros
Fondues, Churrascos e Arroz com feijão.
Livros
Zen, laico ou não.
Esse é muito mais você!
E eu, apesar de leonina, bendigo o Capricórnio.
Acabou o inferno, o sol acaba de entrar em Capricónio.

Glaucia é minha companheira há 25 anos. Monogamicamente. Isso não quer dizer que eu não tenha pensado, imaginado, esbarrado, cheirado todas as outras mulheres que passaram por mim. Mas, na hora do "vamos ver" - sexual ou existencial - é com ela que quero estar. Léo jaime disse que a ereção não é obrigação; é merecimento. Bem, acho que a monogamia também.

POESIAS OCIOSAS

I
[Frequentemente]
O que nos aflige
[Potencialmente]
É o que nos cura.

II
Não busco metáforas
para celebrar os mistérios
do mundo.

III
Convenhamos:
um Deus único,
é muito pouco.

IV
E entrementes,
uma singular menina
não sabe quem sou,
mas sabe de mim.

PERRENGUES DO DIA-A-DIA REVISITADO

Há muitíssimos “blogs” atrás, escrevi um “Perrengues do dia-a-dia”. Outro dia, tomando um whiskinho com a Glaucia nos lembramos de alguns. Aí vai, de cabeça:

- Andando por ruas e bairros de Buenos Aires, sonhando estar em Paris. Andando por ruas e bairros de Paris, sonhando comer um sanduíche de miga em Buenos Aires.

- Chuva torrencial, você, encharcado, corre em direção ao camelô da esquina para comprar um guarda-chuva de cinco merréis. Você não tem os cinco merréis.

- Tomando banho, o telefone toca. Desabalado, você atende: gerúndios em paulistês.

domingo, 9 de janeiro de 2011

PARAÍSO ASTRAL I

Um whisky 12 anos.
Um "puro" cubano.
(E o cheiro feminino de vocês).

É! Estou pronto para o que der e vier.

PARAÍSO ASTRAL II

Uma vaga pressa.
Uma certa urgência.
Um projeto sobre o zen que não termina nunca.
E livros para ler, livros para ler, livros para ler.
(Moro numa biblioteca, disse ela, num momento de resignada lucidez).

Ah! É como diz o Roberto: são tantas emoções...

PARAÍSO ASTRAL III

Filho e pai.
Companheiro e irmão.
Amigos e afetos.
E um quê de realização.
(Árvores, filhos e livros por aí).

Oba! Estou envelhecendo.

PARAÍSO ASTRAL IV

Para Borges, o paraíso é como uma biblioteca.
Para Jorge Amado, como uma rede.
Para mim, bem, para mim o paraíso é como só.

Só lendo, só vendo, só sendo.

sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

Nasci!


Capricórnio - Elemento: terra. Modalidade: impulsivo. Signo complementar: câncer. Regente: saturno. Se o cotidiano estiver relativamente em ordem, acabará sendo muito mais tranquilo acolher e também ser acolhido pelas pessoas que lhe são queridas. (Claudia Lisboa, O Globo, 7/1/2011).

terça-feira, 4 de janeiro de 2011

INFERNO ASTRAL III
Às vêzes penso se não está bom tamanho.
Se já não é tempo, quem sabe, de ir pedindo as contas.
(É que tenho uma doença de mim mesmo).


domingo, 2 de janeiro de 2011

INFERNO ASTRAL II

Galvus, aprovel, atenolol.
Metmorfina, natrilix.
Sinvastatina, lyrica, tetraciclina.
Nausedron, decadron, digesan.

Erbitux, forfiri.
Troninho, imosec, hipoglos.
Neuropatia periférica.

Oi, muito prazer,
meu nome é Luiz

sábado, 1 de janeiro de 2011


INFERNO ASTRAL

Agnus dei qui toles peccata mundi
miserere nobis
(Por isso, não tenho medo).

Sou o tempo de Borges, sou o rio de Heraclito, sou a tromba de Ganecha.
(Por isso, não tenho medo).

Sou o arco, a flecha e o alvo. Tudo se move,
mas o movimento não existe, disse Zenon de Eléia.
(Por isso, não tenho medo).

Sou filho de Omulu, sou o cavalo que Exu monta
nas encruzilhadas do destino.
(Por isso, não tenho medo).

Brahma criou o mundo como ilusão.
Eu sou o mundo.
(Por isso, não tenho medo).

Como derviches rodopinado loucamentes,
dentro de mim, uma célula enlouqueceu.
Essa célula sou eu.
(Por isso, não tenho medo).

Entre amados e chegados, sou grato por ter sido escolhido.
Sou bravo e sou forte, sou guerreiro da tribo Tupi.
(Por isso, não tenho medo).

Sou a gota no oceano. Sou o bigode que o profeta consulta.
Não vamos para lugar nenhum.
(Por isso não tenho medo).

O encontro está marcado,
e a bala, na agulha.
Sou o que semeia, e sou o que colhe.
Sou o que, igualmente, ceifa.
(Por isso, não tenho medo).

(Sim, sou o que pergunta, e sou o que responde.
Não há mais perguntas!
E essa é a resposta).